sábado, 20 de julho de 2013

A Precisão Histórica do Livro de Daniel - conclusão

Tema 17

A Precisão Histórica do
Livro de Daniel - conclusão

Dr. José Carlos Ramos
Julho de 2013


            Outra informação histórica do livro de Daniel alegada pela crítica como incorreta, e que, portanto, conspiraria contra a posição tradicional que atribui a autoria da obra ao próprio profeta Daniel, tem a ver com a figura do rei Dario referida em 5:31, 9:1, 11:1 e principalmente no capítulo 6. Veremos agora que também este ponto não tem o menor peso para aqueles que aceitam a genuinidade histórica e profética de Daniel.

A Identidade do Rei Dario da Média

            Realmente a História jamais menciona um rei da Média assim chamado, principalmente um rei em Babilônia. Para a alta-crítica, essa figura é uma criação do autor de Daniel, inspirada nos reis persas que tiveram esse nome.
            Vejamos primeiro as informações bíblicas quanto a esse Dario:
                        1. Era Médo por descendência - Dn 5:31; 9:1; 11:1
                        2. Era filho de Assuero - Dn 9:1
                        3. Era rei dos caldeus - Dn 9:1
                        4. Reinou em seguida à morte de Belsazar, rei de Babilônia - Dn 5:30, 31
                        5. Reinou dois anos no máximo - Dn 10:1; 11:1
                        6. Organizou o reino apontando 120 príncipes e 3 presidentes - Dn 6:1, 2
                        7. Ciro sucedeu a Dario ou reinou simultâneo com ele - Dn 6:28
                        8. Tinha 62 anos ao começar a reinar em Babilônia - Dn 5:31
                        9. Reinou no desempenho de um governo subordinado - Dn 9:1
             Salvo no que respeita ao nome, não há semelhança alguma deste Dario com qualquer rei persa homônimo posterior. Sem dúvida, trata-se de uma figura histórica do tempo de Ciro, com outro nome. O fato de a História não registrá-lo como Dario não significa que ele não existiu. Segundo o historiador judeu Flávio Josefo, ele tinha um nome diferente para os gregos (Antiguidades Judaicas, X, 11, 4).
            A seguir, uma suma das hipóteses quanto à sua identidade histórica:

                        (1) Dario foi Astíages, avô de Ciro e filho de Ciáxares I que seria o Assuero de Dn 9:1. Esta hipótese fundamenta-se no fato de que Astíages foi o último rei da Média antes de Ciro. Começou a reinar em 588 a.C., sendo, portanto, um homem idoso quando Babilônia foi conquistada por Ciro em 539.
            Segundo os historiadores gregos, Astíages era inimigo de Ciro, e teria tentado mais de uma vez matá-lo. Ciro se rebelou contra ele e o destronou em 549, fazendo-o governador da Hircânia, ao sul do Mar Cáspio. Estes fatos tornam a hipótese muito improvável.
                        (2) Dario foi o próprio Ciro. Dois fatos favorecem esta hipótese: (1) ao derrotar Astíages, Ciro foi reconhecido por Nabonido como rei dos Medos; e (2) inscrições da época indicam que Ciro nomeou novos responsáveis pelo governo das províncias. Todavia, Ciro não é reconhecido como da linhagem dos Medos. É verdade que Mandana, sua mãe, era uma princesa da Média, filha de Astíages, mas o pai, o rei Cambises I, era persa. É, também, muito difícil compreender como Ciro poderia ser chamado “filho de Assuero”, pois esse nome não pode ser considerado uma corruptela do nome de seu pai, e muito menos do de seu avô.
                        (3) Dario foi o filho de Ciro, Cambises II. A hipótese se vale do fato de que Cambises II é citado em vários textos cuneiformes como o rei de Babilônia, em associação com o pai. Mas ela se choca com o pormenor da idade e nacionalidade de Dario. Cambises II era persa e não medo, e é altamente improvável que ele tivesse 62 anos em 539.
                        (4) Dario foi Gobrias, governador de Babilônia sob o domínio de Ciro. Gobrias é mencionado pelo historiador Xenofonte como estando com Ciro na conquista de Babilônia. Esta é a hipótese mais aceita por aqueles que defendem a autenticidade da narrativa de Daniel. É sustentada particularmente por dispensacionalistas. O nome Dario seria uma corruptela de Gobrias, Gubaru na Crônica de Nabonido, ou então um título de realeza. Este documento informa que Gubaru se tornou o governador de Babilônia, e ainda que ele nomeou subgovernadores.
            A hipótese, todavia, conta com três dificuldades: (1) Gubaru viveu muitos anos depois da conquista de Babilônia, o que é dito de Gobrias por Xenofonte; (2) é praticamente impossível que Gubaru fosse da linhagem dos medos. Ele deveria ser assírio ou mais provavelmente persa, segundo informação de Heródoto; e (3) não há evidência alguma de que Gubaru fosse filho de Assuero, e que tivesse 62 anos ao começar a governar em Babilônia.
                        (5) Dario foi Ciáxares II, filho de Astíages. Ciáxares II, portanto, era tio de Ciro. Esta hipótese se vale do testemunho do historiador Xenofonte. Parece que ao destronar Astíages, Ciro, para agradar os médos, permitiu que Ciáxares II ocupasse o trono da Média. Xenofonte informa que ele foi o último governador da Média; informa também que Ciro, tendo conquistado Babilônia, casou-se com a filha de Ciáxares II. Assim aquele que era tio tornou-se também sogro. Ciro, então, ofereceu-lhe a Média como dote de casamento, e pode tê-lo convidado a ocupar um palácio em Babilônia, e atuar na condição honorária de rei.
            Quanto à sua filiação com Assuero (Dn 9:1 e 11:1), seria como neto, e não como filho, a exemplo de Belsazar com Nabucodonosor. Este Assuero, que não deve ser confundido com o rei homônimo do livro de Ester, seria uma variante do nome Ciáxares, e faria referência a Ciáxares I, pai de Astíages.
            No que concerne à Crônica de Nabonido, Ciáxares II pode ter sido Ugbaru, que morreu pouco tempo depois da conquista de Babilônia. Ou então, o nome desse rei poderia estar registrado na parte fragmentada do documento, como sendo a pessoa ilustre por quem se celebrou o luto oficial (SDABC, 4:814-817).
            Prefiro ficar com esta hipótese.
           
Conclusões

            Uma análise não tendenciosa dos alegados “erros” históricos de Daniel demonstra que a falta de credibilidade no livro é apenas uma questão de opinião. Na verdade, é muito mais natural reconhecer a fidedignidade histórica de sua narrativa, do que negá-la. O autor se mostra familiarizado com algumas particularidades tanto do império babilônico como do medo-persa: o sistema babilônico de computação do tempo de reinado, as formas de suplício relatadas nos caps. 3 e 6, a construção por Nabucodonosor da parte nova de Babilônia (erroneamente atribuída pelos historiadores clássicos à rainha Semíramis), e a co-regência de Belsazar. Esses detalhes não poderiam ser conhecidos por alguém que viveu 300 a 400 anos mais tarde e que teria, segundo a alta-crítica, escrito o livro.
            Os críticos, em geral, preferem sair pela tangente, explicando que alguma forma de relatos históricos do tempo dos reis babilônicos e persas, desconhecidos dos historiadores clássicos, teria sido usada pelo suposto escritor para conferir à obra maior originalidade. Alguns, porém, são mais sinceros e reconhecem a dificuldade de se conciliar essa familiaridade com a posição liberal. “Presumivelmente nunca saberemos”, disse R. H. Pfeiffer, da Universidade de Harvard, “como o... autor soube que a nova Babilônia foi criação de Nabucodonosor, e que Belsazar, mencionado apenas nos documentos babilônicos, em Daniel e em Baruque (este último dependente de Daniel), exercia funções reais quando Ciro atacou Babilônia.” (Introduction to the Old Testament, 758, 759).
            Todo o empenho da alta-crítica em negar a existência de Daniel como profeta e escritor do sexto século a.C. revela um dos fatos que se escondem por detrás do preconceito que estimula as posições liberais: a tendência de se dar mais credibilidade aos historiadores seculares que aos sacros. Mas pelo menos em relação às informações legadas por Daniel em seu livro, é a história secular, e não a sagrada, que se equivocou, como o prova a afirmação clássica de que foi Semíramis a construtora da nova Babilônia, e não Nabucodonosor, em frontal contradição com Dn 4:30. Hoje se sabe, através de documentação arqueológica, que Semíramis foi uma rainha assíria, mãe do rei Adad-Nirari III, e que nada teve a ver com as construções em Babilônia, as quais devem ser atribuídas a Nabucodonosor em harmonia com o relato bíblico.
            Nota-se outro equívoco da História quando se compara as conclusões arqueológicas quanto às dimensões de Babilônia com o que Heródoto afirma a respeito. Segundo este historiador, que diz ter visitado Babilônia no quinto século a.C., a cidade era quadrangular, possuindo um perímetro aproximado de 90 km, o que significaria 22,5 km de cada lado, e ocupando uma área de 490 km2 aproximadamente. Os muros mediam 25 metros de largura, e entre 103 e 104 metros de altura. Segundo as escavações, entretanto, a cidade antiga media 1.609 metros de cada lado. Com o prolongamento feito por Nabucodonosor, identificado como cidade externa, o perímetro total ia um pouco além de 16 km. Quanto aos muros, havia um sistema duplo tanto para a cidade antiga como para a nova. A largura máxima não chegava a 8 m.
            É impossível determinar a altura por estarem os muros em ruínas. A maior altura das ruínas é 12,20 metros. Não poderia ser de 103 ou 104 metros, pois haveria uma proporção inviável de 13 metros de altura por 1 de largura. Certamente Heródoto exagerou as medidas da cidade e dos muros.
            Em minha próxima consideração, farei ver que a alta-crítica igualmente se equivoca ao pretender que a mensagem do livro de Daniel evidencia que a obra é uma produção posterior de caráter pseudo-profética e de autoria anônima.

Um comentário:

  1. É meu amigo Pr Ramos.
    Este assunto não é muito fácil para leigos compreenderem, mas os chamados "alta crítica" não são leigos, não é mesmo?
    Para aqueles que aceitam Jesus como centro do universo na batalha do grande conflito cósmico contra Satanás não há dificuldade de aceitar o relato histórico sagrado, logo, a questão está em termos o direito de testemunhar da fé e deixar que o próprio Deus Altíssimo continue a conduzir Sua atividade tanto na história quanto na cabeça dos homens, especialmente de Seus inimigos até que cheguemos ao grande dia. Compreender por exemplo Daniel 11, não é fácil, pois é ali que se desenvolve toda a transição do remanescente império Grego para o Romano, e Roma preparou doutores especialistas em contrafação da verdade para minimizar a realidade histórica do cumprimento exato das profecias para o tempo do fim, e logrou tamanho êxito que maioria do protestantismo acredita e usa as teses dos doutores Romanos para defender sua posição contra o princípio historicista usado pelos adventistas do sétimo dia.
    Meu grande abraço - Robin

    ResponderExcluir